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26 Setembro 2019

Lei de Bases de Habitação

Após vários meses de negociações, no passado dia 5 de Julho foi aprovada pela Assembleia da República a primeira Lei de Bases da Habitação. Com entrada em vigor no dia 1 de Outubro do presente ano, esta Lei tem como objetivo primordial o combate à especulação imobiliária, que tanto tem dado que falar nos últimos meses.

Esta é uma lei que visa sobretudo proteger 4 grupos de pessoas na sociedade: os jovens estudantes ou que buscam a sua autonomia e independência social e económica, os cidadãos com deficiências, de modo a que tanto as habitações como os espaços públicos lhes sejam acessíveis, pessoas idosas, cujo objetivo é dar-lhes condições compatíveis com a sua saúde, e minimizando o isolamento dos mesmos e, por fim, as famílias com menores, monoparentais ou numerosas.

Existem vários pontos a ser destacados nesta Lei nº 83/2019, nomeadamente o facto de ficar estabelecido que o “Estado é o garante do direito à habitação”, o que leva a que tenha um papel essencial tanto na Política Nacional como na Política Municipal de Habitação por esta lei criada. Relativamente à primeira, e de uma forma sintética, fomenta a mobilização do património público para programas de arrendamento, o que permite a existência de rendas compatíveis com os rendimentos das famílias, e a construção, reabilitação ou aquisição para habitação pública. No que toca à segunda política, é dado aos municípios uma autonomia para que possam executar as suas próprias políticas de habitação, assegurando o Estado os meios necessários.

De modo a dar exequibilidade a todas as medidas (sejam locais ou nacionais), e a uma fácil identificação das situações problemáticas, foram por esta lei criados instrumentos, como é o caso do Relatório Anual de Habitação, Carta e Relatório Municipal de Habitação, e criados ainda órgãos para colocar os instrumentos em prática.

Ainda neste âmbito de promoção à habitação, é por esta lei inserido um novo conceito – as habitações devolutas, que consistem em imóveis que, de forma injustificada e continuada, estão sem uso habitacional “por motivo imputável ao proprietário”. Perante estas situações, o Estado passa a ter o dever de, após um inventário anual do património apto a habitação, promover o uso do mesmo, não só quando as habitações devolutas pertencem ao património do Estado, mas também quando pertencem a privados, nomeadamente através de penalizações aplicadas a estes últimos.

Uma nota que está presente em todo o diploma é a constante preocupação por uma ocupação que atenda às questões ambientais, sendo que outra coisa não faria sentido.

Ao nível do cidadão, são várias a medidas introduzidas por esta lei e que o visam proteger diretamente, destacando-se a proteção em situações de despejo, na medida que as pessoas carenciadas em risco de despejo ou que tenham já sido despejadas mas que não tenham alternativa, a estas é-lhes dado um atendimento prioritário de modo a que possam ter acesso a uma habitação adequada. Esta preocupação com que todos tenham uma habitação digna é um traço geral deste diploma, o que justifica que este inclua também medidas para erradicar casos de pessoas sem abrigo.

Uma novidade importante surge no crédito à habitação pois, quanto aos devedores que estejam em “situação económica muito difícil”, a estes é possível a entrega do imóvel ao banco para saldar a dívida, independentemente do valor da mesma, contudo desde que contratualmente estabelecido.

Não podíamos deixar de referir outras medidas importantes como é o caso do aceleramento dos processos de inventário e de heranças indivisas que incluam imóveis com aptidão habitacional, a atribuição aos Municípios do direito de preferência em casos muito específicos, assim como a fiscalização periódica das condições de habitabilidade, particularmente nos grandes centros habitacionais, ou ainda a garantia de um mercado de arrendamento regular e transparente. Fundamentais são igualmente os apoios financeiros por este diploma previstos, assim como a política fiscal, que sempre se mostrou uma aliada importante à mudança de comportamentos por parte da sociedade.

Em jeito de conclusão, apesar de esta ser uma Lei com expetativas bastante elevadas, mostra-se essencial para controlar o aumento exponencial tanto do valor dos imóveis como das rendas, que deixaram especialmente desprotegidos os grupos de pessoas que são o foco de proteção da mesma. Assim, a Lei de Bases da Habitação não faz mais do que garantir o direito à Habitação previsto constitucionalmente, numa altura em que o mesmo foi seriamente colocado em crise.

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